Adoramos bear markets!
Nós, que somos investidores (não especuladores), não gostamos que as cotações subam, mas que caiam, pois quanto mais baixo for o preço, mais acções conseguimos comprar e mais dividendos receberemos no longo prazo.
Valor Teórico das Acções
Como o valor teórico de uma acção corresponde ao valor presente de todos os dividendos distribuídos ao longo da vida útil da empresa, quanto mais dividendos receber no menor tempo possível, menor será o risco de perder o capital investido (partindo do princípio de que essa distribuição não coloca em causa a actividade da empresa e a solidez da estrutura do balanço).
Mas os leitores do Prudente poderão dizer que a Amazon, a Google (Alphabet), a Meta (Facebook) e a Berkshire Hathaway são boas empresas que não distribuem dividendos.
Certo…
Mas se, no ano 3023, a Berkshire (que é uma excelente empresa) apresentar um buraco financeiro gigantesco nas seguradoras e for à falência sem nunca ter distribuído dividendos, hoje vale $0.
Como diz Décio Bazin, no seu livro «Faça Fortuna com Ações»:
«Um investimento vale pelo rendimento que proporciona. [Isto é uma] verdade universal, que, como dogma, não precisa ser demonstrada. Prescinde de apoio, discussão ou aprovação. A chave do sucesso no investimento está aqui. Um papel tem que gerar dinheiro. Investir capital num papel que não gera capital equivale a comprar uma pintura, pregá-la na parede e esperar que se valorize ou que imediatamente apareça alguém que se interesse por comprá-la a preço maior.»
Dividendos e Buybacks
Não podemos esquecer que hoje, mais do que no passado, os investidores são também remunerados pela via da recompra de acções próprias (buybacks), além dos dividendos, principalmente nos EUA:
Quando uma empresa recompra as suas próprias acções, o número de acções em circulação diminui e a participação dos accionistas aumenta. Esse aumento constitui um ganho efectivo, impossível de falsificar pela contabilidade (tal como os dividendos).
Teoricamente, podemos dizer que a remuneração dos accionistas corresponde ao “net payout yield”, isto é, ao ganho em forma de dividendos e recompras líquidas de acções próprias (net buybacks) face ao valor pago pela empresa:
As duas rubricas desse numerador podem ser encontradas na demonstração dos fluxos de caixa…
… embora a contabilidade possa trazer alguns problemas – essas rubricas podem incluir transacções com minoritários, há emissões de acções que podem não passar pela demonstração de caixa, etc.
Então, como calcular correctamente o net payout?
Como calculamos o net payout yield?
Como diz Warren Buffett, “é melhor estar aproximadamente certo do que precisamente errado”.
Como nem sempre a demonstração de fluxos de caixa revela correctamente a remuneração exacta dos accionistas, podendo incluir grandes distorções (principalmente nas holdings com muitas subsidiárias não detidas a 100%), aqui no Prudente preferimos calcular o net payout a partir dos dividendos por acção efectivamente distribuídos (ordinários e extraordinários) e da estimativa dos buybacks líquidos por acção, partindo da variação do número de acções e do seu preço médio.
Como realizamos esta estimativa “aproximadamente certa”?
Exemplo:
Se, num determinado ano, o número de acções cai de 100 milhões para 90 milhões, e se o preço médio das acções corresponde a $1, podemos afirmar que os accionistas receberam uma remuneração de $10 milhões:
(100 M – 90 M) x $1 = $10 M
Simples! No entanto, há aqui um problema.
Se a acção for muito volátil, a empresa pode ter recomprado as acções muito acima ou muito abaixo do preço médio (a remuneração do accionista pode ter sido de $5 milhões ou de $15 milhões, por exemplo). Por isso é que consideramos os valores medianos a 5 anos. Deste modo, a estimativa torna-se muito mais precisa:
Estimativa dos buybacks (mediana a 5 anos = $9 milhões):
- 2022: $10 milhões
- 2021: $9 milhões
- 2020: $8 milhões
- 2019: $14 milhões
- 2018: $5 milhões
Estimativa por acção:
- $9 milhões / 90 milhões de acções = $0,10 por acção
(no Prudente usamos o número médio de acções “diluídas”, que inclui as acções em circulação e as acções potenciais, mas pode ser usado o número de acções em circulação à data de fecho de contas ou à data da publicação dos resultados)
Como simular a distribuição de dividendos?
Nas empresas que remuneram os accionistas através das recompras de acções próprias (buybacks), os investidores podem vender uma parte das acções para simular a distribuição dos dividendos.
Como funciona isto? Vou dar o exemplo da Apple:
Entre 2021 e 2022, o número de acções em circulação da Apple passou de 16,4 B para 15,9 B:
A recompra líquida de acções realizada pela companhia provocou um aumento de 3,1% na participação dos accionistas (16,4 / 15,9 – 1).
Se o accionista vender 3,0% (15,9 / 16,4 – 1) das suas acções, pode manter a sua participação inicial. Somando o dividend yield de 2022 (de 0,7%), obtemos uma remuneração total de 3,7%.
Serviço Prudente
Como explica o nosso “Manual“, aqui no Prudente gostamos de comprar boas empresas com yields medianos superiores a 6% ou, pelo menos, não inferiores a 4%, acima da média de mercado:
Se também tiver um temperamento “Prudente”, não perca a nossa Lista Completa de Acções – temos sempre várias empresas com net payout yields (dividendos + buybacks) superiores a 6%:
Por decisão pessoal, o autor do texto não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico.
2 respostas
Há uma questão que sempre se me levanta quando leio acerca de buybacks e que é: se uma empresa distribui um determinado dividendo, esse valor aparece incrementado na distribuição seguinte após um buyback? É óbvio que esse eventual aumento não é uma imposição mas na prática acontece isso? Ou é só um “valor” que potencialmente poderá ser reflectido nas cotações a curto, médio ou longo prazo?
Olá, Carlos.
Os dividendos distribuídos não, mas o dividendo por acção sim, se o número de acções diminuir e tudo o resto se mantiver constante. A empresa pode anunciar elevados buybacks e emitir ainda mais acções no mercado, fazendo aumentar o número de acções em circulação. Por isso é que me interessa a variação do número de acções e não somente os buybacks brutos. Se o número de acções diminui e a procura/oferta se mantém constante, o preço aumenta. Mas, se a procura pode diminuir e a oferta aumentar, as acções caem, mesmo que o número de acções em circulação diminua.