O professor de finanças
Tive um professor de Finanças na Universidade que não percebia nada de Bolsa, e que era um evangelizador do não-investimento-em-acções. Todas as semanas pregava contra a especulação no mercado financeiro. Aliás… a sua área de investigação incidia sobre a actividade dos gestores que usavam o dinheiro das empresas para recomprar as acções próprias e, assim, melhorar os rácios de retorno sobre o capital, com o propósito de obter prémios salariais por desempenho. Estava sempre a dizer:
É por isso que eu NÃO INVISTO em acções!
Conhecimento e temperamento
A tese do professor é verdadeira. Mas também é verdade que, provavelmente, o dinheiro dele pouco ou nada rendeu desde então. E porquê? Porque, além dele ter um pensamento metonímico (confundido o objecto de estudo – comportamento dos gestores – com a ampla realidade do mundo da Bolsa), não tinha o temperamento de investidor (algo que não depende do Q.I.), e não sabia que as empresas que recompram acções próprias de forma recorrente e sustentável, mantendo altos retornos sobre o capital (entre outros factores), tendem a remunerar bem os investidores no longo prazo, sendo esse um indicador da possível existência de vantagens competitivas duradouras. Com a inflação actual a atingir o maior patamar dos últimos 40 anos (6,2%), será que o ilustre professor vai continuar a querer acumular o património num PPR e em depósitos a prazo a render menos do que nada?
O que tem a dizer um dos maiores investidores de todos os tempos?
Como disse Warren Buffet:
“é extremamente difícil ficar rico com empresas que tenham baixos retornos sobre o capital próprio”.
Quem terá razão? Este velho mestre do investimento em acções ou o meu antigo professor de Finanças?
Primeiro objectivo do Prudente
Neste momento, há cerca de 300 large caps na Bolsa que têm retornos médios sobre o capital próprio superiores a 20%. O meu primeiro objectivo no Prudente é analisar todas essas empresas (objectivo que durará cerca de um ano), separando o trigo do joio, e preparar-me para qualquer correcção nos mercados. No momento em que escrevo este artigo, foram analisadas 158 empresas, embora algumas delas saiam desse escopo.
Total Net Payout
Além disso, é sabido que o lucro inscrito na demonstração de resultados é uma medida contabilística (não de caixa) e que o balanço das empresas contém muitos activos com estimativas erradas. Por isso, é também importante procurar boas empresas a bom preço que, de forma sustentável, paguem bons dividendos e/ou recomprem acções próprias. Ou seja, empresas que tenham um net payout yield médio elevado:
Ao contrário de outras, essas rubricas não mentem!
Há vários artigos e estudos que mostram a relevância do assunto:
“The Long-Run Drivers of Stock Returns: Total Payouts and the Real Economy”: Author Response
NET PAYOUT YIELD – THE BETTER DIVIDEND STRATEGY?
On the Importance of Measuring Payout Yield: Implications for Empirical Asset Pricing
Payout Yields and Stock Return Predictability: How Important Is the Measure of Cash Flow?
A regra dos 6%
Mas o que é um yield elevado? O livro do Décio Bazin, que destaquei no seguinte artigo…
… é muito simples (até peca pela simplicidade), mas muito útil para a formação da mentalidade do investidor de longo prazo. O autor, bem como muitos outros grandes investidores, exigia que as acções lhe remunerassem a uma taxa mínima de 6%:
Por que 6%? A taxa teria sido fixada arbitrariamente? Nada disso, leitor. Já foi dito anteriormente neste livro que no mundo todo convencionou-se que qualquer ativo financeiro deve render no mínimo 6% anuais para ser considerado investimento remunerativo.
Faz isto sentido? Sim, faz! Apesar de nos últimos anos o dividend yield (do qual fala o livro) ter perdido protagonismo para o buyback yield, o total net payout yield continua a ser muito relevante; e se a sua média de mercado corresponde a 4%…
… é lícito exigir 6%, ou seja, uma margem de segurança de 50% (como manda Benjamin Graham).
Exemplo da Apple
Em 2016 e em 2020, o total net payout médio (dividendos e recompras líquidas de acções próprias) da Apple foi de $1,91 e $4,30 por acção, respectivamente:
Nesses anos, as cotações de $30 (2016) e $60 (2020) proporcionaram aos investidores yields superiores a 6%, gerando um retorno superior a 400% (2016) e superior a 100% (2020):
Ao total net payout médio por acção actual ($5,07), seria fantástico poder comprar a acção da Apple abaixo de $85.
Acções ou ETFs?
Ao contrário do meu professor, eu invisto em acções, mas não invisto em fundos ou ETFs. Há várias razões, mas vou apresentar somente duas: (1ª) não me quero expor às 5 maiores empresas, que têm um peso igual às 350 empresas anteriores, no índice S&P 500…
… cuja liderança não vai, certamente, durar para sempre…
… (2ª) nem me quero expor a um único país, pois a realidade económica actual pode não ser a mesma daqui a umas décadas:
Veja-se o caso do Japão, que na década de 60-80 teve um optimismo vertiginoso, e que depois colapsou…
… e o número de anos de predomínio das moedas de reserva mundial:
Não quero com isto desaconselhar o investimento em ETF’s (desde que o leitor saiba que tipo de ETF está a comprar, quais os direitos, quais as características, qual o mecanismo operacional escondido e que algoritmos o gerem, e os outros riscos associados), mas prefiro ser eu a montar o meu próprio ETF, evitando os riscos e a intermediação de um administrador, escolhendo boas empresas a bons preços que remunerem adequadamente os accionistas.
8 respostas
Muito bem explicado.
Obrigado
Obrigado, José.
Simplesmente esclarecedor. Desde já, agradeço.
Obrigado, Diamantino.
Esclarecedor e pratico.
Obrigado, Rui.
Obrigado pela aprendizagem
. Excelente artigo
Obrigado, Alexandre.