Introdução
Há 15 anos, em Maio de 2007, o mercado de acções estava perto de superar o seu máximo histórico (verificado em 2000), algo que só veio a realizar uns meses depois, em Outubro de 2007…
… mesmo antes da crise do subprime, que provocou uma queda de quase 60% (terminada em Março de 2009):
O mercado caiu porque muitos entraram em pânico e venderam as acções ao desbarato, esperando o colapso da nossa civilização. Mas aqueles que tiveram paciência e guardaram as suas acções, mesmo tendo comprado no máximo em Outubro de 2007, estão neste momento a ganhar mais de 235%…
… mesmo considerando a queda actual de 20%, que colocou o mercado em tendência descendente (bear market):
A preocupação da maioria dos portugueses é guardar o dinheiro no banco – que nos últimos 15 anos não rendeu quase nada – tendo em vista a reforma, a realização de um projecto ou alguma situação inesperada futura. Conversando com algumas pessoas leigas no assunto, verifiquei que o principal medo ou percepção de risco era a probabilidade de falência do banco ou instituição financeira.
Nada disso!
O maior risco que as pessoas correm não é o risco de falência do banco, mas a perda do poder de compra provocada pela INFLAÇÃO. Nos últimos meses, após anos de preços estáveis, verificou-se um retorno às altas taxas de inflação, não só em Portugal, como no resto do mundo. Muitos dirão que a culpa é da pandemia da Covid-19, outros dirão que foi Putin e a invasão na Ucrânia, que a culpa é dos especuladores e dos empresários gananciosos, etc. Para mim, os preços estão a subir devido à política expansionista dos bancos centrais, que ocorreu nos EUA após a criação do FED em 1913 e após o abandono do padrão-ouro em 1971, sem falar nos períodos após as crises de 2008, 2020 e 2021, onde o fenómeno foi mais acentuado.
Uma das principais dificuldades na compreensão do fenómeno da inflação reside na definição do seu conceito – pessoalmente, não a entendo como os keynesianos, para quem a inflação é a “subida generalizada do preço dos bens e serviços”, mas como os austríacos, para quem a inflação é o “aumento da quantidade de dinheiro em circulação” que a curto, médio ou longo prazo impacta o preço dos bens e serviços. Se existem 100 unidades monetárias e eu possuo 2 unidades monetárias, tenho 2% de riqueza. Se os bancos centrais imprimem mais dinheiro e duplicam a quantidade de dinheiro (de 100 para 200), a minha riqueza cai para 1% (2/200) e os preços sobem.
Por isso é que, em 1971, nos EUA, uma casa nova custava em média $25.200 e um carro $3.560:
Hoje, o preço médio de um automóvel nos EUA corresponde a quase $50.000. Isto sem falar em países como o Brasil, a Argentina, a Venezuela, entre outros, onde as pessoas perderam todo o seu poder de compra. Quem não conhece a nota de one hundred trillion dollars do Zimbabué que quase nada vale?
Como resolver este problema?
Como contornar o flagelo da inflação (que é um imposto mascarado)?
Como preservar as poupanças realizadas ao longo de uma vida?
Acções e outros tipos de activos
Através de activos produtivos que consigam servir de reserva de valor. Os bancos centrais conseguem multiplicar a quantidade de dinheiro em circulação, mas não conseguem multiplicar o número de empresas, a quantidade de ouro, petróleo, arroz e soja, o número de campos agrícolas e outros imóveis, etc.
Os activos que melhor servem de reserva de valor são os activos produtivos – se o sujeito tem um pomar, vai ganhar dinheiro com a produção de fruta; se tem um apartamento, ganha dinheiro com as rendas; se tem painéis solares, pode ganhar dinheiro a vender electricidade; etc.
Mas se um indivíduo só consegue poupar €100, €300 ou €500 todos os meses para investir em activos produtivos, como poderá ele comprar um laranjal, um apartamento ou uma empresa todos os meses? Resposta: nos mercados financeiros! Na bolsa!
Existem várias bolsas de valores espalhadas pelo mundo. Estas são locais (hoje cada vez mais digitais) onde se compram e vendem empresas (acções), fundos imobiliários (apartamentos, escritórios, centros comerciais, etc.), commodities (petróleo, ouro, prata, trigo, carne, arroz, etc.), títulos de empréstimos (como obrigações), entre outros.
Benefícios de investir em acções
No curto prazo, nada se consegue prever. Há anos em que o petróleo sobe e as acções caem; as acções sobem e o ouro cai; e o ouro sobe e o petróleo cai. É o caos!
Mas, no longo prazo, é evidente que os activos que melhor remuneraram os seus proprietários foram as acções (stocks), que são títulos que representam a propriedade de empresas. Se considerarmos prazos de 10, 20, 30, 50, 100 e 200 anos, vemos que as acções são de longe o melhor activo de investimento:
Depois de ver este gráfico, ainda considera que faz sentido investir num PPR a render juros baixos? Será que Belmiro de Azevedo ou Américo Amorim preferiam colocar as suas poupanças num PPR com juros de 1-2% ou investir nos seus negócios?
A família Amorim detém mais de metade das acções da Corticeira Amorim, logo consegue controlar a empresa, administrando-a. Mas aquelas acções que não estão na sua posse, estão no mercado a saltar de investidor para investidor. Enquanto estes compram e vendem, o valor das transacções sobe e desce, formando o preço – é por isso que o preço das acções também sobe e desce. Enquanto as acções passam por bull markets e bear market (mercados de alta e de baixa), deixando os investidores com sentimentos de euforia e depressão, a família Amorim vai recebendo calmamente os seus dividendos (que são os lucros que as empresas distribuem aos accionistas). Eles não pensam em vender as suas acções só porque o mercado caiu 50%. Eles pensam a longo prazo, nos netos, bisnetos e trinetos.
Investimento vs Especulação
O perfil desta família é o de investidor, não o de especulador. É certo que muitos vêem a bolsa como um casino, especulando sobre como a acção se vai comportar no próximo mês, semana, dia, hora, minuto ou segundo, mas o Investidor Prudente sabe que por detrás de uma acção está uma empresa, um negócio, e não papéis com luzes e gráficos a piscar num ecrã.
O que distingue o investimento da especulação?
Os autores clássicos defendem a necessidade, já muito ignorada e esquecida, desta distinção:
- Investimento: é uma operação que, após análise profunda, promove a segurança do capital investido e um retorno adequado, dentro de uma mentalidade de longo prazo. O seu foco principal é a realidade da empresa (o histórico do balanço da companhia, os resultados, a governança corporativa, os negócios, etc.), não o comportamento das cotações.
- Especulação: é uma operação que não atende àquelas condições do conceito anterior. Aqui, o elemento principal é as expectativas futuras, não os factos ocorridos, desconsiderando (não raras vezes) a história e a realidade da empresa.
Perfil dos investidores
Ou seja, a principal preocupação do investidor é preservar o capital investido e obter um retorno adequado. Os melhores investidores do mundo conseguiram retornos anuais de 10%, 15%, 20%, e quanto maior for a quantidade de capital sob gestão mais difícil se torna obter retornos elevados. Qualquer promessa do tipo «ganhe 10% ao mês» ou «venha viver do daytrading» ou ainda «duplique o seu capital em dois anos» é, evidentemente, insustentável. Nestes casos, como diz a piada, a melhor forma de ganhar 1 milhão é sempre ter 2 milhões no banco.
É verdade que há acções que podem duplicar de valor em poucos meses, mas esse crescimento não é sustentável no longo prazo. Quando os investidores colocam no topo das suas preocupações o crescimento do seu capital, ignorando a segurança e a preservação das suas poupanças, os resultados são geralmente catastróficos e insustentáveis no longo prazo. Todo o Investidor Prudente não deve perder de vista aquilo que o define e a hierarquia dos seus objectivos:
No entanto, dentro dos investidores de longo prazo há diferentes perfis. Por exemplo, há investidores concentram todo o seu capital em poucas empresas e outros diversificam amplamente, comprando:
- empresas de grande capitalização sólidas que pagam bons dividendos
- empresas de pequena capitalização desvalorizadas
- empresas que geram elevados fluxos de caixa, mas que reinvestem todo o capital no seu crescimento
- empresas problemáticas, mas com activos valiosos no balanço
- pontas de charuto (net-nets) e situações deep value
- etc.
Uns focam-se no balanço da companhia, na demonstração de resultados e na demonstração de fluxos de caixa; outros focam-se nas vantagens competitivas, na história de investimento, na governança corporativa e no ownership.
Perfil do Prudente
Continuando a tradição da filosofia de investimento iniciada por Benjamin Graham – autor de obras fundamentais como Security Analysis (1934) e Intelligent Investor (1949) – e por tantos outros investidores de sucesso que partilham da mesma cultura (como Warren Buffett, Charlie Munger, John Templeton, Peter Lynch, Luiz Barsi, etc.), procuramos aqui no Investidor Prudente seguir o nosso mote…
… pescando boas empresas com vantagens competitivas duradouras, que remunerem os accionistas com elevados yields em forma de dividendos e recompras de acções próprias (buybacks) e que tenham elevados retornos sobre o capital, pois, tal como ensina Warren Buffett (um dos maiores investidores de todos os tempos) nas suas cartas aos accionistas da Berkshire Hathaway, as empresas com baixos retornos sobre o capital tendem a ser mais preguiçosas.
Os leitores poderão encontrar uma explicação mais aprofundada no Manual do Investidor Prudente em Acções (download gratuito):
Mas afinal… por onde é que todos os investidores começam? Começam por reunir recursos para investir.
Poupança e fundo de emergência
Há quem nasça já num berço de ouro e tenha, desde sempre, largos recursos para investir, mas a maioria das pessoas, mesmo aquelas que receberam heranças, necessitam de trabalhar e poupar dinheiro para no futuro realizar os seus projectos.
Umas das melhores técnicas de poupança que alguma vez eu conheci está sintetizada numa frase que muitos educadores financeiros costumam utilizar – pague a si mesmo! Isto inverte a lógica que normalmente as pessoas costumam seguir. Em vez de tentar gastar o mínimo possível ao longo do mês para no final juntar uns trocados, a pessoa procurar retirar logo a sua poupança, correspondente a uma determinada percentagem dos seus rendimentos.
Mas antes de tudo, é necessário garantir um fundo ou reserva de emergência, uma determinada quantidade de dinheiro com elevada liquidez que possa ajudar o investidor a sustentar-se ou a sustentar a família durante 6 ou 12 meses sem trabalhar numa situação de urgência.
Vamos concretizar com um exemplo: a família Albuquerque ganha €3.000 por mês, tem três filhos pequenos na escola, uma hipoteca de €400/mês e outros gastos mensais de €1.500. Tem um fundo de emergência de €10.000 em depósitos a prazo que podem ser levantados de imediato sem perda de juros. Todos os meses, logo que recebe o ordenado, a família Albuquerque retira 10% dos seus rendimentos (€300) para investir, e a sua carteira de investimento tem acções, obrigações do tesouro americano e algum ouro. Depois de realizar umas férias, umas idas ao restaurante, programas de diversão em família ao fim-de-semana e donativos, a família Albuquerque ainda conseguiu, no final do ano, poupar uns €2.000, que vão ser colocados a render na carteira de investimento.
Passo-a-passo para investir
Mas como montar uma carteira de investimento?
1. Identificar o seu perfil
Antes de mais, o leitor tem um perfil arrojado ou é muito conservador? Vai querer ter 100% da carteira em acções ou vai querer fazer como a família Albuquerque e manter uma percentagem em acções, obrigações do tesouro americano e algum ouro (ou outros activos como fundos imobiliários ou ETFs), por exemplo, rebalanceando a carteira regularmente?
E depois, quantas empresas vai querer ter em carteira? Benjamin Graham recomendava ter entre 10 e 30 empresas, mas há quem prefira, por vários motivos, ter menos de 10 ou mais de 30 acções.
Considere sempre que, ao longo da sua jornada de investimento, o mercado pode cair várias vezes mais de 50%, e que isso não lhe pode tirar o sono. Se tem insónias, deve então reconsiderar a percentagem a alocar em acções e o número de acções em carteira. O pior que pode fazer é entrar em pânico quando o mercado cai e em euforia quando o mercado sobe. O papel de todo o Investidor Prudente é sempre comprar acções aos pessimistas para as vender aos optimistas, e não o contrário.
2. Abrir conta num intermediário financeiro
Para aceder aos mercados financeiros e comprar acções, obrigações e fundos cotados em bolsa (ETFs), o investidor necessita de abrir conta num intermediário financeiro, seja um banco ou corretora. Na escolha do intermediário, o investidor deve considerar a reputação da instituição, os custos e a localização da sede. As mais renomadas, entre os investidores portugueses, são a Degiro, a XTB e a Interactive Brokers, mas estas corretoras (que podem ter ou não suporte em português e sucursais em Portugal) não têm sede em no nosso país. As portuguesas têm normalmente custos mais elevados, mas estão mesmo aqui ao pé. Há muitas:
Atenção aos custos de transacção, às comissões e à custódia (muitas corretoras oferecem isenções e custos baixos).
3. Definir a estratégia de investimento
No mundo da bolsa há duas grandes áreas analíticas ou métodos de análise – a análise técnica e a análise fundamental. A análise técnica é um método de análise que procura avaliar os instrumentos financeiros através da leitura dos gráficos de cotações. A análise fundamental procura avaliar os títulos a partir dos seus fundamentos – no caso das acções, os fundamentos são as informações que constam das demonstrações financeiras (do balanço, da demonstração de resultados, da demonstração de fluxos de caixa, entre outros), dos relatórios e contas, dos press releases, etc.
Como as únicas pessoas ricas que conheço da área da análise técnica são as que vendem cursos e software de análise técnica, prefiro seguir os fundamentos das empresas, à semelhança dos grandes investidores em acções do nosso tempo. Mas dentro da análise fundamental há vários tipos de estratégias e abordagens: há quem compre barato para vender ao preço justo, há quem compre caro para vender ainda mais caro, há quem compre e nunca venda, há quem compre ao preço justo e mantenha excelentes empresas enquanto as vantagens competitivas se mantêm, há quem compre empresas falidas para tirar o dinheiro de lá, há quem compre com recurso a técnicas quantitativas sem saber o que compra… há muita coisa.
Aqui no Prudente, procuramos excelentes empresas, com vantagens competitivas duradouras e altos retornos sobre o capital, que remunerem os accionistas com dividendos e buybacks elevados (net payout yield)…
… normalmente com um yield superior a 6%, isto é, com 50% de margem de segurança face à média de mercado (que corresponde a aproximadamente 4%):
Porque é que procuramos empresas baratas? Porque a longo prazo as acções baratas têm um desempenho melhor do que as acções de crescimento e do que o mercado em geral:
4. Ter consistência
É sempre necessário não perder o foco – o investidor precisa de poupar recursos todos os meses, seja por via do salário ou dos dividendos das empresas; necessita de investir nas melhores oportunidade do momento; e de cuidar da carteira, rebalanceando regularmente as posições em cada um dos activos (sejam acções, obrigações, fundos, depósitos, ouro, etc.).
Já vi muitos investidores em large caps que, passados uns meses, vendiam tudo para comprar small caps, e que depois quando estas começavam a piorar o desempenho voltavam para as large caps, mudando de estratégia consoante o humor. O investidor necessita de conhecer o seu perfil, definir uma estratégia e executá-la com consistência, quer faça chuva quer faça sol. Se o investidor define comprar todos os meses acções da Apple ou da Google, por acreditar muito nestas empresas a longo prazo, não pode parar de fazê-lo só por estas terem caído no mercado, como aconteceu com a Apple entre 2008 e 2009, quando caiu mais de 50%.
Aqui no Prudente procuramos manter sempre a mesma rotina:
- Geramos uma lista com todas as acções do Prudente, ordenada pelos melhores yields.
- Separamos o trigo do joio, excluindo as piores empresas da Lista Completa de Acções do Prudente (disponibilizada aos subscritores).
- Escolhemos a melhor acção do momento, uma vez por mês, enviando aos subscritores a «Acção do Mês».
- Acompanhamos os resultados de todas as «Acções do Mês», até que saiam dessa categoria.
- Repetimos o processo, fazendo com que os juros compostos trabalhem a nosso favor.
5. Pagar impostos
Esta é a pior parte. Sempre que realizar a venda de uma acção pode ter uma mais-valia (ganho) ou menos-valia (perda), e essa operação deve ser declarada ao fisco. Os dividendos estão sujeitos a retenção na fonte, mas por vezes existe a obrigação ou faculdade de os declarar. Para o ajudar neste processo, preparei um Guia Fiscal do Investidor em Ações 2023 (download gratuito)…
… que contém indicações úteis acerca do preenchimento do IRS. Se for empresário, pode sempre comprar acções no nome da sua empresa e indicar ao contabilista as operações realizadas, para que este as possa tratar em sede de IRC.
6. Estudar
Dizia Charlie Munger que, em toda a sua vida, nunca conheceu «pessoas sábias que não lessem a todo o momento; nenhuma, zero», e achava que ninguém se podia tornar um bom investidor «sem fazer uma grande quantidade de leituras».
Como o investimento não é uma ciência infusa, há 3 livros que gostaria de recomendar a todos os Investidores Prudentes. Um para investidores iniciantes (Faça Fortuna com Acções), outro para intermediários (The Intelligent Investor) e outro ainda para avançados (Security Analisys, com o texto da edição de 1940)…
… além do meu ebook Como se tornar um Investidor de Longo Prazo…
… com dicas de leituras e resumos.
Resultados esperados
O índice Dow Jones, que contém as 30 maiores empresas americanas, rendeu historicamente cerca de 6,8% ao ano, entre 1896 (ano da criação do índice por Charles Dow) até à data da publicação deste artigo (descontando a inflação):
Sabemos que o desempenho passado não é garantia de resultados futuros, mas se conseguirmos obter 10%, seleccionando as melhores empresas a bons preços, e poupar todos os meses €300, como a família Albuquerquer, quanto conseguiremos juntar em 40 anos (480 meses)?
Quase €1,9 MILHÕES!!!
A diferença entre 6,8% do índice Dow Jones e 10% parece pequena, mas o índice teria rendido menos de metade (€744 mil em vez de €1,9 milhões):
Agora imaginem Warren Buffett, que ganhou mais de 20% ao ano, desde 1965 até 2021. Teria transformado os €300 mensais da família Albuquerque em mais de €26 MILHÕES!!!
Este é o poder dos juros compostos!
Está preparado para começar a investir hoje?
Saiba mais aqui.